Scalp care é uma tendência de mercado que consiste em produtos direcionados para o cuidado do couro cabeludo. Os consumidores de produtos cosméticos já conhecem a importância dos cuidados com a pele. Entretanto, muitos ainda não conhecem a importância do couro cabeludo na aparência capilar. Recentemente, isso começou a mudar. O segmento de scalp care ainda é um nicho, mas se mostra promissor. No geral, os mesmos conceitos utilizados na criação de produtos de skin care podem ser utilizados na criação de produtos de scalp care. Um dos pontos chaves é, além da formulação do produto, a comunicação da marca com o consumidor, o que inclui educá-lo, ou seja, mostrá-lo a importância e benefícios dos cuidados com o couro cabeludo.
Neste artigo o que você verá:
- Impacto da saúde do couro cabeludo nos cabelos;
- Como formular produtos utilizando esse claim?
O couro cabeludo
O cabelo e couro cabeludo possuem uma relação inseparável, uma vez que ambos fazem parte do sistema tegumentar. O cabelo é considerado um anexo cutâneo (que também inclui as unhas, glândulas sebáceas, entre outros componentes).
A pele do couro cabeludo possui algumas características diferentes da pele de outras regiões, como a maior quantidade de glândulas sebáceas. O couro cabeludo também é um ambiente propício para os microrganismos. Áreas que possuem maior quantidade de glândulas sebáceas normalmente possuem maior diversidade de microrganismos, o que pode impactar na fisiologia cutânea e desenvolvimento de condições patológicas.
A base do folículo capilar, ou seja, o bulbo, possui 4mm de profundidade na pele, e é o local onde ocorre a proliferação celular que inicia o crescimento da fibra capilar. A fibra capilar então deixa o bulbo e se direciona à superfície do couro cabeludo, processo que dura duas semanas. Após deixar o bulbo, a fibra se torna biologicamente morta. Ou seja, quando estamos falando de cabelo, estamos falando de um material morto.
A fibra inicia o processo de maturação (também chamado de queratinização) e extensão, resultando na fibra que emerge no couro cabeludo. Esse processo de maturação é análogo ao das células na camada basal da epiderme, que formam o estrato córneo, também composto de células ‘mortas’. A série de alterações físicas e químicas possibilitam o crescimento e fortalecimento da fibra capilar.
A condição do couro cabeludo pode impactar nas características da fibra capilar, uma vez que a maturação da fibra consiste em interações entre a interface cabelo-couro cabeludo.
Portanto, atualmente há interesse em compreender como a saúde do couro cabeludo pode influenciar nas características da fibra capilar. Existem algumas condições que podem afetar a saúde do couro cabeludo, como a psoríase e dermatite seborreica.
Conceito de fibra pré-emergente e pós-emergente
As condições do cabelo dependem de fatores pré-emergentes e pós-emergentes. O estresse oxidativo, que pode ser causado por fatores como radiação UV, inflamação mediada por microrganismos e oxidação dos lipídios, pode afetar o fio pré-emergente. Já o fio pós-emergente pode ser impactado por estresse oxidativo causado pela radiação UV e oxidação por colorantes, por exemplo.
Alguns estudos in vitro já analisaram que células cultivadas de couro cabeludo careca crescem de maneira mais devagar quando comparadas com células de couro cabeludo não careca. A diminuição da proliferação foi associada com alterações na morfologia celular, expressão de marcadores de senescência, aumento dos marcadores de estresse oxidativo e danos no DNA.
Existem alguns estudos que analisaram a relação do couro cabeludo e cabelo. No geral, esses estudos fazem uma comparação de amostras de cabelo obtidas de couro cabeludo com alguma condição, como psoríase, por exemplo, e comparam com amostras obtidas de couro cabeludo saudável. Foi observado que condições como dermatite seborreica, dermatite atópica e psoríase podem impactar a fibra capilar. Geralmente, essas condições podem resultar na diminuição do diâmetro capilar, corrosão, aumento de estresse oxidativo, e queda capilar. A maior alteração é na cutícula capilar. Além de alterações físicas, também há algumas alterações na composição química da fibra.
Psoríase
A relação da psoríase com as características do cabelo é uma das mais estudadas. Fios de cabelo localizados em áreas lesionadas por psoríase podem apresentar diferenças morfológicas, como menor diâmetro e corrosão superficial. Além disso, essas áreas também apresentam maior perda de cabelo. Também apresentam cutículas quebradas e desgaste geral. A psoríase também pode causar a perda prematura de cabelos, por conta de um aumento da fase telógena e diminuição da fase anágena.
Caspa/Dermatite Seborreica
As características do couro cabeludo, como o grande número de folículos capilares, contribuem para uma taxa maior de descamação. Mesmo um couro cabeludo normal (que não apresenta nenhuma patologia), pode experienciar algum grau de descamação dentro de 1 ou 2 semanas caso não seja lavado. Quando há a ocorrência de caspa, há uma aceleração na proliferação de células epidérmicas, resultando em uma maior descamação. A inflamação do couro cabeludo também aumenta a descamação e o índice refrativo dos agregados celulares (que são os ‘flocos’ da caspa). A colonização do fungo Malassezia e sensibilidade são fatores que podem favorecer a inflamação.
A dermatite seborreica é uma condição crônica, caracterizada por inflamação e manchas eritematosas, recorrente em áreas com alta presença de glândulas sebáceas. A causa dessa condição também envolve fungos do gênero Malassezia.
O processo inflamatório causado pelo fungo Malassezia, um dos principais microrganismos no microbioma do couro cabeludo, é mediado pelos metabólitos desse fungo, principalmente ácidos graxos livres.
Normalmente, o cabelo de indivíduos que possuem dermatite seborréica/caspa apresenta diminuição de brilho. No geral, é possível observar as mesmas características capilares observadas em cabelos de indivíduos com psoríase. Apesar de, nesse caso, os efeitos no cabelo serem menores, ainda observa-se características capilares como: superfície mais áspera, aumento de corrosão e borda das cutículas mais espessas. Também há possível perda de cabelo prematura associada com dermatite seborréica.
Portanto, é possível observar que o maior impacto que condições do couro cabeludo podem causar no cabelo são relacionados com a integridade da cutícula, resultando em um cabelo com maior corrosão, cutículas mais espessas e diminuição de brilho.
Além disso, o próprio envelhecimento fisiológico da pele, o que inclui o couro cabeludo, pode impactar o cabelo da mesma maneira que condições como psoríase e dermatite seborreica, por conta, principalmente, do aumento do estresse oxidativo.
A formação da cutícula se dá pela queratinização, que ocorre na interface entre a fibra capilar que está crescendo e a epiderme que a cerca. A fibra que está crescendo é ‘macia’ e vulnerável antes de se tornar rígida. Portanto, acredita-se que o estresse oxidativo da epiderme pode alterar esse processo. Isso pode fazer com que as células da cutícula na fibra capilar pré-emergente se tornem mais quebradiças que o normal.
Ao emergir no couro cabeludo, a fibra é exposta a diferentes situações e ações, como lavagem, secagem e modelagem. Essas situações podem prejudicar o fio, principalmente se as cutículas já estiverem danificadas, piorando ainda mais as características da fibra. O cabelo que emerge de um couro cabeludo danificado pode ser classificado como um cabelo com aparência ‘envelhecida’. Quanto mais áspera é a superfície capilar, maior será a fricção entre as fibras, o que aumenta ainda mais o desgaste da superfície da cutícula. Portanto, se o cabelo já ‘nasce’ danificado, há uma aceleração no desgaste da fibra capilar.
Criando produtos de scalp care – Novas evidências científicas e dados de mercado
Um estudo publicado em 2020 no International Journal of Cosmetic Science analisou os efeitos do extrato da raiz de Lindera strychnifolia no microbioma do couro cabeludo. Essa planta é encontrada em alguns países do continente asiático. Nas suas raízes é possível encontrar moléculas de polifenóis, terpenos e ligninas, que podem melhorar a proliferação celular e o crescimento capilar. No estudo, o extrato foi incorporado na concentração de 1% em uma formulação de loção. Foram utilizados voluntários com alopécia androgenética, que aplicaram a loção com 1% de extrato durante 83 dias. Os autores do estudo concluíram que o extrato foi capaz de modular o microbioma do couro cabeludo. A partir da atuação no microbioma, o ativo pode auxiliar na diminuição da queda capilar. Esse ativo está disponível no mercado sob o nome comercial HairilineⓇ (INCI Name: Propanediol, Aqua, Lindera strychnifolia Root Extract).
Outro estudo recentemente publicado analisou o uso do extrato de Ageratum conyzoides L. no estímulo do crescimento capilar e diminuição de sua queda. Essa planta possui propriedades anti-inflamatórias, antioxidantes e analgésicas, e pode ser utilizada no tratamento de desordens cutâneas e cicatrização de feridas, por exemplo. Os resultados dos testes in vitro e in vivo mostram que a aplicação tópica deste extrato pode melhorar a queda capilar e auxiliar no crescimento dos cabelos. O extrato foi responsável por inibir a liberação e expressão da prostaglandina D2 e da enzima 5-α redutase tipo 1. A inibição da prostaglandina e da enzima é uma possível estratégia para a diminuição da queda capilar.
O potencial de ginseng e seus metabólitos no crescimento capilar já foi estudado. O ginseng, assim como os ginsenosídeos (saponinas que atuam como bioativos), podem regular a expressão e a atividade de muitas proteínas envolvidas no ciclo de crescimento capilar. Os ginsenosídeos são os principais responsáveis pelo estímulo de crescimento capilar promovido pelo ginseng. Os ginsenosídeos também possuem ação anti-idade, o que pode auxiliar na regulação do ciclo capilar e saúde do folículo capilar. O ginseng vermelho, por exemplo, pode inibir a atividade da enzima 5-α-redutase, por conta da alta concentração de ginsenosídeo. Essa ação do extrato pode auxiliar no crescimento capilar. Apesar de ser promissor, ainda são necessários mais estudos, principalmente clínicos, para avaliar a ação do extrato dessa planta no crescimento capilar e redução de queda. O Ginseng Extract GNBN (INCI Name: Water (and) Glycerin (and) Panax Ginseng Root Extract (and) Sodium Benzoate (and) Potassium Sorbate) é um exemplo de extrato disponível no mercado que pode ser utilizado em produtos de scalp care.
Capilia Longa PPF (INCI Name: Curcuma Longa (Turmeric) Callus Culture Conditioned Media (and) Water), que possui secretomas do rizoma da Curcuma, é um ingrediente que consiste em peptídeos de plantas. As secretomas são ricas em peptídeos sinalizadores. É responsável por reativar o crescimento capilar e reduzir a queda.
BaicapilTM (INCI Name: Propanediol (and) Water (and) Arginine (and) Lactic Acid (and) Glycine Soja (Soybean) Germ Extract (and) Triticum Vulgare (Wheat) Germ Extract (and) Scutellaria Baicalensis Root Extract (and) Sodium Benzoate (and) Gluconolactone (and) Calcium Gluconate) é um blend que combina Scutellaria Baicalensis, soja e germe de trigo. De acordo com o fabricante, é responsável por estimular o crescimento dos cabelos e reduzir quedas.
PhytoCellTec™ Malus Domestica Hair (INCI Name: Malus Domestica Fruit Cell Culture Extract (and) Xanthan Gum (and) Glycerin (and) Lecithin (and) Phenoxyethanol (and) Aqua/Water) é uma cultura de células-tronco de plantas que protege o cabelo contra envelhecimento prematuro e queda.
O ácido salicílico é um ativo amplamente utilizado em formulações para caspa. É um beta-hidroxiácido com ação queratinolítica. A patogênese da caspa envolve a alta proliferação de queratinócitos, desregulando a queratinização. Os corneócitos se agrupam, formando flocos. Agentes queratolíticos, como o ácido salicílico, enfraquecem a ligação entre os corneócitos, fazendo com que eles sejam removidos com a lavagem (em formulações de shampoo). No Brasil é permitido em concentração de até 3% em produtos capilares com enxágue.
O piritionato de zinco é um ingrediente comum em produtos direcionados para o cuidado do couro cabeludo. A adição de 1% desse ativo em formulações de shampoo, por exemplo, pode beneficiar o crescimento capilar. Além disso, a utilização do ativo em formulações capilares pode diminuir o estresse oxidativo no couro cabeludo e nos cabelos.
Tabela 1 – Produtos de scalp care de mercado e ingredientes de destaque
Nome do produto | Tipo de produto | Marca | Ingredientes de destaque |
Reset exfoliating Jelly Shampoo | Shampoo | Amika | Ácido salicílico e Argila Rosa |
Serene Scalp Anti-Dandruff Shampoo | Shampoo | Oribe | Ácido salicílico, cafeína e extratos vegetais |
InvatiTM advanced exfoliating shampoo rich | Shampoo | Aveda | Extrato de Curcuma Longa, Extrato da raiz de Ginseng, Ácido salicílico |
Charcoal + Tea Tree Scalp Treatment | Sérum/Tônico | Briogeo | Óleo de melaleuca e carvão (em pó) |
Multi-Peptide Serum for Hair Density | Sérum | The Ordinary | Peptídeos e extratos vegetais |
Caffeine Stimulating Scalp Treatment | Sérum | The Inkey List | Cafeína e RedensylⓇ (Givaudan Active Beauty) |
Hair & Scalp Oil | Óleo | Jozy Curls | Manteiga de Karité e Óleo de Marula |
Scalp Balancing Bar | Barra de limpeza | Gemmist |
Óleo de Gengibre, Óleo de Eucalipto, Óleo de Melaleuca |
Conclusão
O cabelo e couro cabeludo possuem uma relação inseparável, e a condição do couro cabeludo pode influenciar as características do cabelo. Condições cutâneas como dermatite seborreica e psoríase, podem acarretar em perda de brilho, queda capilar e corrosão na superfície da cutícula dos cabelos. Atualmente no mercado existem alguns ingredientes que podem atuar melhorando a condição do couro cabeludo, como blends de extratos vegetais, além de ingredientes clássicos, como o ácido salicílico.
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