Entrevista: Longevidade no Brasil – Expectativa de vida impõe desafio às marcas

Entrevista: Longevidade no Brasil – Expectativa de vida impõe desafio às marcas

Levantamento da Mintel aponta que 73% das pessoas acima de 55 anos mantém rotina de beleza e cuidados pessoais

A expectativa de vida do brasileiro estava em ascensão antes da pandemia. Segundo dados do IBGE, em 2019 a média passou a ser 76.6, enquanto em 2018 era de 76.3, ou seja, no período de um ano, houve um ganho de três meses.

Pode ser que as análises futuras tenham algum impacto com tudo o que o mundo vem enfrentando, mas a verdade é que não é de hoje que a longevidade entrou no radar das empresas de diversos segmentos. A pirâmide etária brasileira segue a tendência dos países europeus com diminuição do número de jovens e aumento do número de pessoas acima de 65 anos.

Dentre os fatores que corroboram para este movimento, está a busca por qualidade de vida e bem-estar. Resumindo, as pessoas estão se cuidando mais em comparação com décadas anteriores. Diante disso, como o setor de beleza e cuidados pessoais está se preparando para atender essa camada da população?

O in-cosmetics Connect voltou a conversar com a analista sênior de beleza e cuidados pessoais da Mintel, Amanda Caridad, para entender este cenário. O bate-papo abordou desde o desenvolvimento de produtos para cabelo para esse público às rotinas de embelezamento e o impacto da pandemia. Confira a entrevista abaixo:

in-cosmetics – Nos últimos anos, o Brasil tem apresentado aumento na expectativa de vida. Como o mercado de beleza tem acompanhando esse processo?

Amanda Caridad – Apesar de o IBGE estimar que em 2043 um quarto (25%) da população brasileira deverá ter mais de 60 anos, o mercado em geral ainda trata a população idosa como um mercado de nicho, oferecendo poucos produtos específicos para esta faixa etária, além de baixa representatividade em campanhas publicitárias.

Para a categoria de beleza, é imprescindível que as marcas ofereçam soluções pautadas por bem-estar físico e mental, já que a pandemia aumentou a preocupação desses consumidores em relação à sua saúde. As marcas podem ajudar esses consumidores ao conectarem as rotinas de beleza e cuidados pessoais a uma forma de aumentar sua qualidade de vida. Conforme pesquisa realizada pela Mintel, 73% dos brasileiros com 55 anos ou mais acreditam que manter uma rotina de beleza e cuidados pessoais é importante para que tenham boa qualidade de vida. Dentre as principais atividades que fazem parte da sua rotina de beleza e cuidados pessoais, 79% desses entrevistados usaram perfume / colônia, 69%, produtos para cuidados da pele do corpo, e 68%, produtos para cuidados da pele do rosto.

O maior isolamento dos idosos durante a pandemia aumentou a busca por bem-estar e para a categoria de beleza e cuidados pessoais pode refletir em um movimento de ritualização das rotinas. Em um levantamento também realizado pela Mintel, 21% dos brasileiros com 55 anos ou mais têm usado produtos da categoria para lidar com a tensão/estresse. Além disso, 36% dos entrevistados afirmaram que passaram a tomar banhos mais longos como uma forma de relaxamento, e um em cada três (33%) passaram a usar produtos para a casa com fragrâncias que ajudem a criar uma atmosfera acolhedora no lar.

produtos para a terceira idade

INC – Pelo que vocês analisam, as marcas estão se preparando para esse movimento? Quais áreas oferecem mais opções de produtos para o público acima de 60 anos?

AC – Perfumes, produtos para cuidados da pele do corpo e do rosto estão entre as categorias de produtos mais utilizadas pelos brasileiros com 55 anos ou mais. Um dos dados que chama a atenção na pesquisa, é que dentre os brasileiros que mantêm uma rotina de beleza e cuidados pessoais, 96% demonstram interesse por produtos que melhorem a saúde de sua pele. A categoria de produtos de cuidados da pele poderia explorar claims relacionados à proteção da pele contra agressores externos (raios UV, poluição, luz azul), além de promover a saúde de dentro para fora da pele. Para uma indústria que lucra há mais de 30 anos com o termo “anti-idade”, mudar o paradigma de que envelhecer é algo negativo poderia ser inovador e libertador para os consumidores com 55 anos ou mais.

INC – Por que no Brasil ainda temos poucas opções em comparação com os produtos para público jovem-adulto?

AC – A indústria de beleza sempre foi altamente influenciada por movimentos sociais, e o conceito de juventude foi algo muito lucrativo para a indústria por muitos anos. As marcas encontram na atualidade, um consumidor mais inquisitivo, que quer se sentir mais representado, e não se forçar a seguir um ideal inalcançável. A pesquisa da Mintel aponta que a própria noção de envelhecimento é muito subjetiva, e 73% dos brasileiros com 55 anos ou mais se sentem mais jovens do que a sua idade, apesar de apenas 12% concordarem que sua faixa etária é retratada de forma precisa pela publicidade.

Com o envelhecimento da população e aumento da busca por soluções que sejam mais inclusivas, as marcas de beleza serão cada vez mais pressionadas para oferecer soluções que estejam alinhadas às demandas do público sênior por longevidade e envelhecimento saudável. No mesmo estudo, 35% dos brasileiros com 55 anos ou mais gostariam que houvesse produtos e serviços feitos exclusivamente para sua faixa etária.

INC – Além de produtos de cuidados com a pele, quais as oportunidades de negócios surgem para as empresas do setor de cosméticos, com o envelhecimento da população?

AC – Um dos reflexos da pandemia foi o aumento da preocupação em relação à saúde, em especial a manter o sistema imunológico fortalecido. A pesquisa da Mintel mostra que 26% dos brasileiros com 55 anos ou mais passaram a ingerir vitaminas e suplementos desde o início da pandemia, sendo que 52% desses entrevistados ingeriram produtos que promovem fortalecimento do sistema imune.

Para além dos benefícios à saúde física, esta categoria pode inovar incluindo benefícios adicionais que despertem o interesse desse público. Outro dado importante: 40% dos brasileiros com 55 anos ou mais gostariam que esses produtos exclusivos para a sua idade oferecessem benefícios adicionais à prevenção do envelhecimento, incluindo melhora da performance ao praticar exercícios físicos e melhora da saúde cognitiva.

INC – Quais são os hábitos de consumo das pessoas 60+ quando pensamos em cosméticos?

AC – Durante a pandemia esses consumidores adotaram rotinas mais minimalistas, com menos passos. O levantamento da Mintel revela que 31% desses consumidores seguiu com uma rotina simples de cuidados faciais, ao passo que 17% adicionaram uma nova etapa em sua rotina de cuidados corporais, ampliando o consumo de esfoliantes, cremes e loções para cuidados da pele do corpo, sobretudo das mãos que sentiram os efeitos causados pelo uso mais frequente de álcool gel e pelas rotinas de limpeza do lar mais intensas.

INC – Em relação ao tratamento dos cabelos do público 60+, o que muda nos cuidados com os fios nessa faixa etária? De que forma isso influencia o desenvolvimento de produtos capilares?

AC – Com o processo de envelhecimento, os fios tornam-se mais ressecados, indisciplinados e suscetíveis à quebra, necessitando de cuidados redobrados na lavagem, evitando xampus que ressequem ainda mais o cabelo, e de tratamentos de hidratação mais intensivos.

Além disso, a exposição ao sol pode potencializar o amarelamento dos fios, sendo importante recorrer ao uso de produtos que ofereçam proteção contra os raios UV. Segundo o levantamento da Mintel, a rotina de cuidados capilares dos consumidores com 55 anos ou mais foi intensificada durante a pandemia, com 43% desses consumidores afirmando que passaram a lavar os cabelos ao retornar para casa de locais públicos. O medo em relação à COVID-19 fez com que 26% desses consumidores utilizassem tinturas capilares em casa, sendo que este percentual aumenta para 45% entre as mulheres de 55 anos ou mais.

Apesar dessa parcela significativa ter buscado por tinturas que possam ser aplicadas em casa, 29% dos brasileiros desta faixa etária deixaram seus cabelos grisalhos durante a pandemia, e pretendem mantê-los assim mesmo com o fim da pandemia.

cabelos grisalhos

INC – O que o mercado brasileiro oferece em termos de opções e novidades para os cabelos do público 60+?

AC – No Brasil algumas marcas têm inovado ao oferecer produtos exclusivos para os consumidores com fios grisalhos (independente da sua idade), como é o caso da Lola Cosméticos e d’O Boticário, que trouxeram linhas exclusivas que prometem melhorar a aparência dos fios e protegê-los contra o amarelamento causado pela exposição aos raios UV. A Pantene, apesar de não comunicar a linha “Nutre & Cresce” como sendo exclusiva para consumidores com cabelos grisalhos, trouxe em sua campanha uma modelo com fios brancos e sem tantos retoques.

INC – Há exemplos no mercado exterior que podem inspirar as marcas nacionais?

AC – Com a maior discussão em relação à saúde sexual e como ela pode interferir no bem-estar emocional e físico, algumas marcas de beleza têm inovado ao oferecer produtos de cuidados faciais exclusivos para mulheres que estejam passando pela menopausa.

Nos EUA, Pause Well-Aging é uma das marcas que têm liderado esse tipo de conversa. Lançada em maio de 2019, a marca fala abertamente sobre a menopausa e fornece em seu site um espaço para que as consumidoras possam enviar a sua história sobre essa fase.

INC – Com a longevidade, como o segmento de produtos capilar para público 60+ deve impactar o mercado nacional de cosméticos nos próximos anos? Quais as perspectivas?

AC – É esperado que alguns dos impactos observados durante a pandemia continuem a ser refletidos no futuro, especialmente a adesão aos fios grisalhos, particularmente entre as mulheres. As marcas deverão investir em linhas de tratamento que promovam benefícios de hidratação e proteção contra os elementos externos, além de trazerem campanhas publicitárias mais inclusivas e que abordem o empoderamento gerado pela liberdade da beleza mais natural e fora do padrão.

Apesar de representar uma barreira ao uso de tinturas capilares, as marcas da categoria podem inovar com tinturas que deixem os fios brancos mais uniformes. Um exemplo é a L’Oréal, que convidou a atriz Samara Felippo para finalizar sua transição para os fios brancos, em uma ação que gerou repercussão positiva nas redes sociais, e inspirou seguidores da marca nas redes sociais a seguirem o exemplo de Samara.


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