O acúmulo de gordura no tecido adiposo é um dos principais motivos de insatisfação corporal, principalmente entre as mulheres, devido às alterações perceptíveis em diversas áreas do corpo, principalmente abdômen, coxas e região dos glúteos.
Este fenômeno é frequentemente caracterizado pelas lipodistrofias conhecidas como celulites e gordura localizada. Muitos consumidores buscam formas de lidar com esses problemas de por vias não cirúrgicas, e esse fato contribui para que o desenvolvimento de produtos para o tratamento tópico desses problemas estéticos seja alvo de intensos estudos.
No artigo de hoje, explicarei sucintamente os mecanismos que levam ao acúmulo e à quebra da gordura no tecido adiposo, bem como alguns ativos que promovem a lipólise e como podem ser incorporados em produtos cosméticos.
O tecido adiposo é um tecido conjuntivo frouxo, que tem como principal componente celular, o adipócito, que é especializado em armazenar o excesso de calorias ingeridas na forma de triacilglicerol.
Além dessa função de armazenamento, o tecido adiposo forma também um isolante térmico, responsável por ajudar na manutenção da temperatura corporal – contribuindo para a manutenção da homeostase do organismo, além de proteger diversos órgãos e secretar diversas citocinas. Ou seja, apesar de antigamente ser considerado como um tecido inativo, atualmente o tecido adiposo é considerado um órgão endócrino, que possui até mesmo funções do sistema imune.
A lipogênese é o processo pelo qual os adipócitos captam a gordura corporal (que nesta fase se encontra nas formas de quilomícrons e lipoproteínas) e a armazenam na forma de triacilglicerol por meio da enzima lipase de lipoproteínas.
Quando o indivíduo se encontra em superávit calórico, ou seja, ingere mais calorias do que o corpo necessita diariamente, ocorre este tipo de armazenamento, que é saudável e necessário para o correto funcionamento do organismo (os hormônios esteróides, por exemplo, necessitam desse aporte de gordura para serem sintetizados). Contudo, quando o acúmulo de gordura ocorre de forma exacerbada, podem surgir algumas mudanças na pele que podem ser consideradas por algumas pessoas, problemas estéticos, como a celulite e a gordura localizada, por exemplo.
A lipodistrofia ginóide, também chamada de celulite, acomete praticamente todas as mulheres no período pós-puberdade, e é causada pelo acúmulo de gordura no tecido adiposo. Contudo, a obesidade não é fator determinante para a formação dessa condição. A celulite está presente em cerca de 85% a 98% das mulheres ao redor do mundo.
A celulite, contudo, não é encontrada na maioria dos homens, já que o padrão dos lóbulos de gordura subcutânea e dos septos de tecido conjuntivo que os separam se mostra diferente entre homens e mulheres, favorecendo a formação deste problema estético nas mulheres. O padrão da junção dermo-epidérmica também é diferente em ambos os sexos, o que provavelmente também influencia na formação deste problema (nos homens, a junção dermo-epidérmica é suave e contínua, enquanto que nas mulheres, a mesma se encontra irregular e descontínua).
Além disso, as celulites parecem ter forte associação com o estrógeno, já que são encontradas principalmente nas áreas onde este hormônio possui influência, como coxas, nádegas e quadris.
Já a gordura localizada corresponde a um acúmulo de gordura em locais específicos, como abdômen, coxas, glúteos, seios, etc. Esta condição acomete indivíduos de ambos os sexos.
A diferença entre um acúmulo de gordura comum e a condição da gordura localizada é referente ao local onde esta gordura se deposita. Em condições normais, a gordura se acumula superficialmente, acima da fáscia muscular, logo abaixo da camada cutânea. Na condição de gordura localizada, o acúmulo de gordura ocorre em profundidade maior – entre a fáscia e os músculos, ou mesmo nos músculos, o que a torna extremamente difícil de ser eliminada.
Ambas as lipodistrofias anteriormente citadas (celulites e gordura localizada) são condições que incomodam muitos indivíduos ao redor do mundo. Sabe-se que tratamentos invasivos (como as cirurgias) demandam cuidados especiais, e, portanto, muitas pessoas tendem a evitá-los. Esse cenário abre espaço e serve como um incentivo para o desenvolvimento de produtos tópicos capazes de lidar com tais problemas estéticos.
Uma forma de tratamento consiste na utilização de ativos que promovam a lipólise, ou seja, a quebra da gordura.
A lipólise é um processo que consiste na quebra do triacilglicerol em moléculas de ácidos graxos e glicerol. Este processo ocorre por intermédio das enzimas lipases, que podem ser ativadas ou inibidas pelas catecolaminas (noradrenalina e adrenalina) e por hormônios (insulina, glucagon e adrenocorticotropina). A adrenalina, a noradrenalina, o glucagon e a adrenocorticotropina ativam as lipases, enquanto a insulina inibe a sua atividade. Dependendo dos hormônios e do tipo de receptor nos adipócitos, o processo de lipólise pode ser ativado ou inibido.
A insulina ligada ao receptor adrenérgico estimula o armazenamento da gordura dos adipócitos, enquanto o segundo receptor (adrenérgico), quando ligado à adrenalina, noradrenalina, glucagon ou adrenocorticotropina e estimula a quebra da gordura.
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Metilxantinas
Um dos ativos conhecidos pelos seus efeitos associados à lipólise é a cafeína. A cafeína é uma metilxantina encontrada principalmente no café e em alguns chás – como o chá verde e o chá preto. Para que os ativos possam ter efeitos reais na pele, é necessário que eles sejam absorvidos por ela. Alguns estudos demonstraram que a cafeína é altamente absorvida pela pele, sendo que, após 24h de uma aplicação tópica, as maiores concentrações de cafeína (280g/tecido) estavam localizadas na epiderme, enquanto que as menores quantidades (50g/tecido) foram detectadas na derme. A cafeína é capaz de ativar a lipólise por meio de diversos mecanismos de sinalização intercelular. Ela pode afetar, por exemplo, a secreção de catecolaminas, que ativam os receptores adrenérgicos, aumentam a concentração de cAMP nas células e ativam o hormônio lipase-sensitivo. Esse ativo também bloqueia os receptores adrenérgicos, prevenindo o acúmulo excessivo de gorduras, e acelerando o processo de lipólise. Além disso, a cafeína também possui atividade antioxidante e estimuladora da microcirculação sanguínea. Em resumo, os principais efeitos do uso tópico das metilxantinas em cosméticos são a prevenção do acúmulo excessivo de gordura na pele, a promoção da drenagem linfática local e a proteção da pele contra os prejuízos causados pela radiação ultravioleta. Em produtos cosméticos, a cafeína é utilizada em concentrações de até 8%. Outras metilxantinas, como a teobromina, que é derivada do cacau, por exemplo, são utilizadas em concentrações de até 4%. A cafeína é um ativo hidrossolúvel que pode ser incorporado tanto em géis, quanto em emulsões cosméticas. Retinol O retinol é também conhecido como vitamina A, e possui diversos derivados que também são utilizados em cosméticos, como o retinaldeído, por exemplo. Alguns estudos demonstraram que o retinol atua na lipólise por inibir a diferenciação dos pré-adipócitos em adipócitos, ou seja, é um inibidor da formação das células de gordura (anti-adipogênico). Outros estudos, in vivo, demonstram que o ácido retinóico também é capaz de promover tais efeitos, uma vez que pode aumentar as proteínas mitocondriais de desacoplamento, causando assim a dissipação de calor no tecido adiposo, gerando a redução da gordura subcutânea. De acordo com o Parecer Técnico nº 3, de 22 de março de 2002, emitido pela ANVISA, a vitamina A pode ser utilizada em formulações cosméticas em concentração máxima de 10.000 Ul quando na forma de Retinol ou Palmitato de Retinila, e, nestes casos, deve ser especificada a concentração da vitamina na formulação. Quando utilizada na forma de retinaldeído, a concentração máxima estipulada é de 0,05%.Extrato de semente de uva (Vitis vinifera)
A parte mais utilizada das uvas vermelhas (Vitis vinifera) em cosméticos são as sementes. Os efeitos do resveratrol, polifenol contido nas uvas, são bastante conhecidos, porém, este não é o único composto benéfico para uso tópico contido nesta fruta. Além dos flavonoides, as sementes de uva também produzem as leucocianidinas (que são procianidinas que atuam no aumento das vesículas vasculares e linfáticas) e os taninos, que auxiliam na redução da peroxidação lipídica, ou seja, inibindo a liberação de espécies de radicais livres que podem ser liberadas durante a degradação dos lipídios. Outras espécies vegetais, como o Ginkgo biloba, o gengibre, a Centella asiatica e o alecrim também demonstraram possuir ativos capazes de reduzir a aparência das celulites, porém, os mecanismos de ação de tais ativos ainda não foram completamente elucidados. Contudo, alguns desses ativos demonstraram reduzir a aparência de tais problemas estéticos devido à ativação da microcirculação sanguínea local, à proliferação e diferenciação das fibras de colágeno ou mesmo devido à sua ação antioxidante. Existem diversos ativos disponíveis no mercado atual que são derivados dos compostos citados anteriormente (metilxantinas, retinol, fitoativos e óleos essenciais). Portanto, há um grande leque de opções para o desenvolvimento cosméticos que reduzem a aparência das celulites e da gordura localizada por meio da promoção de lipólise. Diversos estudos sobre os mecanismos de ação de tais ativos demonstraram a sua eficácia em uso tópico. Sabendo que uma pele livre de celulites e de gordura localizada pode ser importante para a auto estima de alguns consumidores, a formulação de produtos cosméticos promotores de lipólise pode ser bastante atrativa, tanto para os consumidores quanto para os formuladores. Espero que com este artigo você tenha conseguido obter algumas ideias para a formulação de produtos promotores de lipólise. Gostou desse artigo? Espero que sim e adoraria saber sua opinião! Deixe seu comentário abaixo sobre o que você mais gostou. O objetivo deste artigo é contribuir para a elevação do nível técnico de profissionais interessados na área. Para qualquer orientação mais aprofundada procure sempre um profissional apto e com experiência no assunto. Procurando por mais informações técnicas? Leia aqui: Nanotecnologia, microbioma e inteligência artificial: tecnologias inovadoras na cosmetologia Criando cosméticos veganos para aproveitar oportunidades do mercado A influência da embalagem na estabilidade do produtoReferências:
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