Quem nunca procurou sentir o perfume de um shampoo, de um sabonete ou de uma loção corporal antes da compra? A fragrância é um fator de peso na escolha de um produto de beleza ou de higiene pessoal e, por isso, em um mercado tão competitivo e com tantas opções, prover ao consumidor a melhor experiência sensorial pode ser a chave do sucesso. Esse peso foi mostrado em uma pesquisa publicada pela Mintel, em 2014. [1, 2, 3]
Veja no infográfico abaixo o comportamento dos consumidores de alguns dos mais importantes mercados de cosméticos:
Adaptado de Mintel, 2014. [3]
Segundo esta mesma pesquisa, o consumidor brasileiro também leva muito em consideração o perfume de uma formulação na hora da escolha de um produto. No Brasil:
Na prática, as fragrâncias são utilizadas em formulações de beleza e higiene pessoal não só para mascarar odores de certas matérias-primas, mas também para despertar as emoções e o prestígio social ou econômico associado ao uso de determinados produtos. A decisão de um consumidor em comprar um certo produto é, muitas vezes, baseada em motivos emocionais que transcendem a sua funcionalidade e, por isso, a escolha da fragrância é tão importante no desenvolvimento de um cosmético. [4, 5]
Mas, dado que as fragrâncias fazem parte de uma experiência tão subjetiva, como o formulador pode traduzi-la em um conceito a ser incorporado em um produto final? Neste ponto, é preciso explicar como funciona o universo da perfumaria para que se possa entender como fazer as escolhas certas.
Em termos gerais, uma fragrância não é composta de uma molécula pontual. Na verdade, ela é uma composição de moléculas voláteis obtidas de diversas fontes, sejam elas naturais ou sintéticas, algumas com odor agradável e outras nem tanto, que resultam em um aroma prazeroso conseguido por perfumistas habilidosos. Uma fragrância é composta por três diferentes tipos de notas:
- Nota de cabeça (de topo ou de saída): moléculas mais voláteis, responsáveis pelo odor inicial e intermediário de uma fragrância;
- Nota de coração (ou de corpo): moléculas menos voláteis que as anteriores, responsáveis pelo odor principal e mais duradouro que a nota de saída;
- Nota de fundo: composta pelas moléculas menos voláteis e representam o aroma de longa duração.
As notas de cabeça, coração e fundo formam o que se chama de pirâmide olfativa. Ao final, as fragrâncias formadas são classificadas em diferentes famílias olfativas, que são mostradas a seguir com um pouco de suas características. [4, 6]
Adaptado de “As Grandes Famílias Olfativas”[6]
Essas famílias são, ainda desmembradas em diversas subfamílias. Diante de tantas opções de fragrâncias existentes e tantas sensações olfativas que podem ser despertadas, como escolher aquela que agradará mais o consumidor final?
Muitas pessoas usam termos como green, floral, frutal, amadeirado, animal, doce, musk, herbal e outros, em associação com certos estados humanos de humor. Fragrâncias cítricas ou lavanda são, por exemplo, frequentemente associadas ao relaxamento, enquanto que as baseadas em pimenta e jasmim são tidas como energizantes e estimulantes. Na hora de formular, o primeiro ponto importante a se considerar é o do casamento entre a fragrância escolhida e o conceito do produto, pois é essa mensagem que levará o cliente a uma experiência sensorial que pode destacar o seu produto dos demais concorrentes. A importância da associação entre a fragrância e o conceito é mostrada em uma pesquisa realizada com 25 participantes do sexo feminino, com idades entre 18 e 35 anos: uma imagem de uma loção, ligada a uma frase prometendo deixar a pele suave e fresca, foi apresentada às voluntárias. À parte, três fragrâncias diferentes (denominadas A, B e C), foram sentidas por estas mulheres. Embora a fragrância B tenha sido a que elas mais tenham gostado, quando associada ao conceito de pele suave e fresca, houve um efeito negativo. O mesmo aconteceu para a fragrância A, que inicialmente também provocava uma reação positiva entre as participantes. Ao contrário das demais, a fragrância C, que não havia chamado a atenção quando experimentada sozinha, passou a despertar emoções positivas nas voluntárias quando associada ao conceito. [4, 7]
Esta percepção também tem um fator cultural: ainda segundo a pesquisa elaborada pela Mintel, europeus e asiáticos têm preferência por fragrâncias florais em produtos de higiene pessoal, enquanto que norte-americanos preferem aromas mais frutados e gourmet (que lembra os alimentos, como baunilha, por exemplo). Já o Oriente-Médio e a América Latina têm uma tendência em aceitar melhor os aromas tipo fantasy (floral-frutal). No Brasil, as cinco principais notas olfativas conforme levantado em 2013 foram: floral, fresca, lavanda, rosas e baunilha. Outro ponto cultural relevante a se considerar é o fato de que o brasileiro tem o perfume como um sinalizador de higiene e beleza, ao passo que os orientais são mais discretos com relação à perfumaria. [3,9]
À parte dos gostos e da cultura do consumidor alvo, o segundo ponto a ser levado em conta é o de que algumas características aromáticas originais de uma fragrância podem ser perdidas quando incorporadas em uma formulação não alcoólica, como uma emulsão. O resultado olfativo da aplicação da fragrância incorporada em um produto pode não ser o mesmo de sua aplicação direta na pele. Além disso, existe a possibilidade de haver incompatibilidades com os outros componentes do produto: fragrâncias baseadas em ésteres não devem ser utilizadas em produtos de pH baixo devido à possibilidade de hidrólise das moléculas que a compõem. Para prevenir instabilidades, as interações químicas em potencial devem ser consideradas, também, em formulações antimicrobianas com compostos quaternários de amônio, agentes oxidantes e ácidos ou bases fortes. Não se deve esquecer que a fragrância pode interagir, inclusive, com a embalagem que comportará o produto e, por isso, é muito importante realizar testes para a verificação prévia dessas interações. [4]
Por último, também deve-se levar em conta que todos estamos expostos diariamente às fragrâncias, da mesma maneira que ocorre com qualquer outra matéria-prima cosmética. Alguns indivíduos, em decorrência dessa exposição diária, podem desenvolver dermatites de contato, caracterizadas pelo eritema (vermelhidão), pelo inchaço e pela formação de vesículas na pele diante da a exposição ao composto alergênico. Com a persistência do contato, um quadro crônico pode ser desenvolvido. Outras irritações possivelmente causadas por fragrâncias são as reações imediatas ao contato (urticária de contato), dermatite pigmentada e foto sensibilidade. Então, além do cuidado com a estabilidade, o terceiro ponto a se levar em consideração é a segurança da formulação, algo crucial a ser garantido. Tanto isso é verdade que, no Brasil, a RDC nº 03/2012 lista as substâncias que foram identificadas como causa importante de reações alérgicas de contato entre os consumidores sensíveis a fragrâncias e aromas. Elas devem ser indicadas na descrição dos ingredientes quando sua concentração exceder 0,001 % nos produtos sem enxágue e 0,01 % em produtos com enxágue. [5, 9]
Portanto, muita atenção na hora da escolha da fragrância para um produto: associe a fragrância ao conceito da formulação, busque saber os gostos do potencial cliente final e avalie sua estabilidade e sua segurança para lançar seu produto. Uma escolha adequada aumenta as chances de sucesso da sua formulação!
Referências:
[1] Schaefer, K. Speaking the Fragrance Language. Cosmetics and Toiletries, 2013. Disponível em: http://www.cosmeticsandtoiletries.com/formulating/function/fragrance/215536981.html
[2] In Cosmetics. The smell of success is in the air at in-cosmetics’ Fragrance Zone. Disponível em: http://new-incos-news.bitnamiapp.com/2015/01/the-smell-of-success-is-in-the-air-at-in-cosmetics-fragrance-zone/
[3] Mintel. Fragrance in cosmetics – the smell of success. In Cosmetics Hamburg, 2014. Disponível em: http://www.in-cosmetics.com/rxuk/rxuk_incosmetics/2014-website/marketingtrends/1april_1500-1545_globalscenttrendstheuseoffragranceincosmetics_mintel.pdf?v=635321269626019192
[4] Schroeder, W. Understanding Fragrance in Personal Care. Cosmetics and Toiletries, 2013. Disponível em: http://www.cosmeticsandtoiletries.com/formulating/function/fragrance/premium-understanding-fragrance-in-personal-care-216615041.html
[5] European Comission. Health and Consumers. Scientific Committees. Perfume Allergies. Disponível em: http://ec.europa.eu/health/scientific_committees/opinions_layman/perfume-allergies/en/l-2/1-introduction.htm#0
[6] As Grandes Famílias Olfativas. Disponível em: https://www.perfumaria.com.pt/pdf/Olfativas.pdf
[7] Niedziela, M.M.; Carbone, E.; Thau, B. Applied Neuroscience to Understand Cosmetic Consumers: Product
Development (part III). Cosmetic and Toiletries, 2015. Disponível em: http://www.cosmeticsandtoiletries.com/testing/methoddevelopment/Applied-Neuroscience-to-Understand-Cosmetic-Consumers-Product-Development-part-III-323009291.html
[8] Brazil Beauty News.com. Maior mercado consumidor de perfumes, Brasil abriga microtendências de fragrâncias. 2016. Disponível em: http://www.brazilbeautynews.com/maior-mercado-consumidor-de-perfumes-brasil,1209
[9] Brasil. RESOLUÇÃO – RDC Nº 03, de 20 de Janeiro de 2012. Aprova o Regulamento Técnico “LISTAS DE SUBSTÂNCIAS QUE OS PRODUTOS DE HIGIENE PESSOAL, COSMÉTICOS E PERFUMES NÃO DEVEM CONTER EXCETO NAS CONDIÇÕES E COM AS RESTRIÇÕES ESTABELECIDAS” e dá outras providências.
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